‘‘Vocês têm ouvido muitos sermões arminianos, eu ouso dizer, mas nunca ouviram uma oração arminiana... Um arminiano de joelhos orará desesperadamente como um calvinista. Ele não pode orar a respeito do livre-arbítrio; não há lugar para isso. Imagine-o orando: ‘‘Senhor, eu te agradeço que não sou como esses pobres calvinistas presunçosos. Senhor, eu nasci com um glorioso livre-arbítrio; eu nasci com poder pelo qual posso me voltar para Ti por conta própria; tenho melhorado minha graça. Se todos tivessem feito o mesmo que eu fiz com a tua graça, poderiam todos ser salvos. Senhor, eu sei que Tu não nos fazes espiritualmente propensos, se nós mesmos não quisermos. Tu dás graça a todos; alguns não a melhoram, mas eu sim. Haverá muitos que irão para o inferno, tantos quantos foram comprados pelo sangue de Cristo, como eu fui; eles tiveram uma boa chance, e foram tão abençoados como eu sou. Não foi a tua graça que nos diferenciou; eu sei que ela fez muito, mas eu cheguei ao ponto desejado; eu usei o que me foi dado e os outros não — essa é a diferença entre eu e eles’’.[1]
Pecador, inconverso pecador, eu te advirto que jamais poderás tu mesmo fazer com que nasças de novo; e embora o novo nascimento seja absolutamente necessário, te é absolutamente impossível, a não ser que o Espírito Santo faça isso... Faças o que fizeres, e o melhor que conseguires, ainda assim, há uma diferença, tão grande quanto a eternidade, entre ti e o homem regenerado... O Espírito de Deus precisa fazer-te novo, tu precisas nascer de novo.
O mesmo poder que ressuscitou Jesus Cristo dentre os mortos tem que agir para ressuscitar-nos dos mortos; a mesma onipotência, sem a qual anjos e vermes não poderiam ter vindo à existência, precisa se manifestar e realizar uma obra tão grande quanto a que Ele fez na primeira criação, recriando-nos em Cristo Jesus, nosso Senhor. Constantemente a igreja cristã tenta esquecer isto, mas sempre que esta velha doutrina da regeneração é apresentada claramente, Deus se apraz em agraciar a sua igreja com reavivamento... A menos que Deus, o Espírito Santo, que opera em nós tanto o querer como o realizar, opere sobre a vontade e a consciência, a regeneração é uma absoluta impossibilidade, e assim também a salvação. “O quê!”, diz alguém, “Você quer dizer que Deus intervém absoluto na salvação de cada pessoa para regenerá-lo?”. Sim, eu quero; na salvação de cada pessoa há um brotar de poder divino, pelo qual o pecador morto é vivificado, o pecador sem vontade é feito desejoso, o pecador mais duro e desesperado tem sua consciência amolecida; e aquele que rejeita a Deus e despreza a Cristo é feito prostrar-se aos pés de Jesus.
Tem que haver uma intervenção divina, uma operação divina, uma influência divina, caso contrário, façam o que puderem, sem isso vocês perecerão e estarão condenados — “pois, se um homem não nascer de novo, não pode ver o reino de Deus...” Nunca esqueçamos que a salvação de uma alma é uma obra de criação. Pois bem, nenhum homem jamais conseguiu criar um inseto... Deus somente cria... Nenhum poder humano ou angelical pode intrometer-se nesta gloriosa província do poder divino. Criação é domínio exclusivo de Deus. E em cada cristão há uma absoluta criação — “criados de novo em Cristo Jesus”. “O novo homem, segundo Deus, é criado em retidão”. Regeneração não é a reforma de princípios que lá estivessem antes, mas a implantação de algo que não existia; é a introdução em um homem de algo novo, chamado Espírito, o novo homem — a criação não de uma alma, mas de um princípio ainda mais elevado — tão mais elevado com relação à alma quanto a alma o é do corpo... No ato de fazer com que qualquer homem creia em Cristo, há uma manifestação verdadeira e própria de poder criador, assim como houve quando Deus criou os céus e a terra... Apenas Ele, que formou os céus e a terra, poderia criar uma nova natureza. É uma obra sem paralelo, ela é única e incomparável, visto que o Pai, o Filho e o Espírito precisam todos cooperar nela; pois, para implantar a nova natureza em um cristão, precisa haver um decreto do Pai eterno, a morte do eternamente Bendito Filho e a plenitude da operação do adorável Espírito. [2]
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[1] Spurgeon, Livre Arbítrio, p.17 (Citado por Paulo Anglada em Calvinismo As Antigas Doutrinas da Graça)
[2] Murray, The Forgotten Spurgeon, pp. 87-89. (Citado por Paulo Anglada em Calvinismo As Antigas Doutrinas da Graça)